Opinião: Mãos grossas

Anísio Cláudio Rios Fonseca (de Formiga/MG)

Opinião: Mãos grossas
(Anísio Cláudio Rios Fonseca é professor pesquisador do Unifor-MG e coordenador do laboratório de mineralogia) e-mail: anisiogeo@yahoo.com.br




Graciliano Ramos, em sua obra-prima “São Bernardo”, criou um personagem excepcionalmente bem elaborado, com o qual me identifico em muitas coisas. Entre outras características, me identifico muito com a sua maneira simples e direta de ver as coisas. Esta maneira simples muitas vezes acaba sendo a maneira correta, a qual levamos muito tempo para concluir porque pesamos e medimos todas as variáveis diversas vezes, e acabamos mudando de opinião.

Quando se interessou por Madalena, a comparação entre ele e homens conhecidos foi imediata. Ele se considerava muito bruto em relação aos demais. A preocupação do personagem com sua aparência e com suas mãos também chamou minha atenção. Mãos grandes, grossas, calosas, gretadas, no dizer dele. Ele se perguntava como poderia acariciar uma fêmea com semelhantes mãos? Embora nas manifestações de carinho mãos assim possam importunar um pouco, não acredito que seja um defeito. Na verdade, mãos fortes e calejadas são testemunhos de trabalho duro ou atividade que exige esforços extremos. Nosso organismo, para se proteger, acaba engrossando a pele e criando calosidades (queratina) onde os esforços são mais intensos. Deduzo que, em geral, quem tem mãos duras não manda fazer, faz; Pode acariciar com elas ou ser brutal como um bate-estacas; possui uma força muito maior que a das outras pessoas, mas normalmente a guarda para seu trabalho. 

As mãos são os veículos utilizados pela imaginação para criarem qualquer coisa, desde performances emocionantes nos instrumentos musicais, nas artes e, infelizmente, em atos violentos também. Nas artes marciais, podemos aprender a tornar o corpo mais resistente aos impactos e reforçar a estrutura óssea das mãos. Com isso, os treinos acabam por incutir no aluno uma autoconfiança muito maior, mas, com certeza, isso nada tem a ver com violência ou instinto violento. Qualquer academia séria seleciona o tipo de aluno que treina ali, logo, o aperfeiçoamento acaba sendo um objetivo de crescimento pessoal.

Observando minhas mãos, vejo que não são duras quanto as mãos do personagem do livro, porém estão sempre atuando em algum trabalho braçal ou em algum objeto artesanal que faço, sem se ferirem com qualquer coisa. É uma pena não serem talentosas (nem de longe) como as de Yamandu Costa quando escrutina aquele violão de sete cordas e nem como as de Steve Vai, Joe Satriani, Jimmy Page e outros monstros do rock que admiro, mas elas servem muito bem aos meus propósitos.  

Tudo isso vale para a maioria de nós, com mãos duras ou não. As mãos que afagam a criança chorosa ou a pessoa amada são as mesmas que constroem, protegem e encantam com sua arte, mas, acima de tudo, ficam ainda mais talentosas quando se juntam humildemente para agradecer ao Deus universal por serem a ferramenta mais perfeita que existe na Terra.