Aos 101 anos, morre Ângela Vaz Leão

Professora e pesquisadora formiguense foi considerada uma das mineiras mais importantes pelo Governo Estadual

Aos 101 anos, morre Ângela Vaz Leão
Ângela Tonelli Vaz Leão se tratava em casa de uma infecção pulmonar; ela faleceu neste domingo, dia 3, em Belo Horizonte, onde construiu sua carreira de sucesso




Formiga perdeu neste domingo, dia 3, uma filha ilustre, considerada pelo Governo do Estado uma das mineiras mais importantes da história do país. A educadora, filóloga, professora e pesquisadora Ângela Tonelli Vaz Leão, que se tratava em casa de uma infecção pulmonar, faleceu aos 101 anos, em Belo Horizonte, onde construiu sua carreira de sucesso.

A notícia de sua partida comoveu a comunidade acadêmica da capital mineira, assim como a comunidade formiguense. A prefeita em exercício, Adriana Prado, decretou Luto Oficial no Município nesta segunda-feira, dia 4, em sinal de profundo pesar pelo falecimento da notável cidadã formiguense, Ângela Vaz Leão.

“Foi com profundo pesar e consternação que recebemos a triste notícia do falecimento da formiguense Ângela Tonelli Vaz Leão, figura ilustre e de singular importância para a educação, arte e cultura em Minas Gerais. Durante sua trajetória profissional, Dona Ângela, como era carinhosamente conhecida, sempre se referiu à sua terra natal com especial afeto. Manifestamos nossa solidariedade aos familiares e amigos enlutados e decretamos Luto Oficial no Município nesta segunda-feira, 4 de março, por meio da publicação do Decreto 10.308”, divulgou.

Em Formiga, a biblioteca do Unifor-MG, criada em 1966, leva o nome da ilustre formiguense, que foi grande doadora de livros para o estabelecimento. Ela também foi uma incansável batalhadora pela instalação da Fundação Educacional de Formiga (antiga Universidade do Oeste de Minas, hoje Fuom).

Nascida nas Areias Brancas no dia 1º de outubro de 1922, a docente Ângela Vaz Leão foi uma das grandes referencias latino-americanas no campo da literatura medieval – em particular, no que concerne à poesia galego-portuguesa do rei-poeta Dom Afonso X, da qual era contumaz analista e tradutora. Foi figura central no processo de criação e consolidação da Faculdade de Letras (Fale) da Universidade Federal de Minas Gerais, sendo a primeira diretora entre 1969-1973, e primeira coordenadora do Programa de Pós-Graduação da universidade.

O portal da UFMG trouxe uma matéria sobre a morte e trajetória da formiguense. “Seu trabalho e dedicação ergueram, portanto, os pilares da Fale, e seu legado de pesquisa contribuiu para colocar nossa instituição em proeminência nos cenários nacional e internacional”, comentou a atual diretora da Fale, Sueli Maria Coelho.

“Seu legado será sempre reverenciado. Devemos muito à professora Ângela Vaz Leão, que é um símbolo da UFMG, instituição pela qual sempre nutriu enorme respeito e amor. Ela sempre incluiu a nossa instituição em seus projetos", destacou a reitora Sandra Regina Goulart Almeida.

De acordo com a diretora Sueli Coelho, a professora Ângela Leão manteve-se intelectualmente ativa até os 100 anos e, para homenageá-la, a Faculdade de Letras está preparando, em parceria com a Editora Mercado de Letras, a publicação do trabalho de pesquisa ao qual dedicou a maior parte de sua vida: a edição bilíngue (galego-português/português) das 427 Cantigas de Santa Maria, do rei-poeta D. Afonso X (1221-1284), de cuja obra foi uma das maiores especialistas. A publicação será lançada ainda neste semestre.

“Ela ficou encantada e emocionada com a arte e a capa da obra”, diz Sueli, que visitou a mestra no último dia 19 de fevereiro. Na ocasião, a diretora da Fale comentou com a professora que pretendia promover um lançamento na Unidade e perguntou se Ângela estaria disposta a comparecer. A resposta foi imediata: “Estou pronta”.

No mesmo encontro, Ângela também formalizou seu último desejo em relação à Fale ao doar para a Unidade sua vasta biblioteca, formada por volumes que mantinha em casa e no sítio da família. “Foi a forma generosa que ela encontrou de nos presentear e de enriquecer o acervo da Biblioteca Professor Rubens Costa Romanelli, fomentando as pesquisas linguísticas e literárias, duas áreas às quais ela se dedicou com muita maestria”, afirma a diretora, ela própria uma das muitas discípulas que Ângela ajudou a formar em sua carreira. Em 2001, Sueli cursou a disciplina Cantigas de Santa Maria no mestrado da PUC-MG, onde Ângela passou a atuar após se aposentar na UFMG. “O corpus da minha pesquisa eram as cantigas, e Ângela participou de minha banca de defesa”, relembra Sueli.

 

Depoimentos de colegas

Na véspera do centenário da professora (1º de outubro de 2022), a revista “Diversa”, em edição comemorativa aos 95 anos da UFMG, publicou um perfil em homenagem à mestra com depoimentos de colegas e ex-alunos. O professor Jacyntho Lins Brandão, que também dirigiu a Faculdade de Letras e foi vice-reitor da UFMG, também destacou a marca que Ângela imprimiu à Fale, “que guarda o seu DNA”, e chamou a atenção para a influência que ela exerceu sobre os seus alunos. “Tive o privilégio de ser um deles. E pela vida afora, quando penso o que deve ser um professor, tenho o também privilégio de não titubear: é ser como Dona Ângela”.

Em depoimento para a mesma edição, outro discípulo de Ângela, o também professor Thiago Saltarelli, da Fale, escreveu que a convivência que teve com ela se assemelhava à antiga relação mestre-aprendiz. “Com Dona Ângela, as fronteiras entre o acadêmico e o pessoal, entre o ensino e um convívio mais íntimo, se diluem”.

 

Biografia da formiguense

Ângela Vaz Leão graduou-se em Letras em 1949 pela UFMG, onde defendeu tese de livre-docente em 1959. Na Universidade, ela atuou como professora e pesquisadora de 1959 a 1987 e recebeu o título de professora emérita em 1990.

Após aposentar-se na UFMG, Ângela Leão foi professora titular da PUC-MG, onde atuou na pós-graduação em Letras, abrindo a frente de estudos das literaturas africanas de língua portuguesa. No cenário nacional, ocupou o cargo de presidente da Associação Brasileira de Linguística (Abralin), na gestão 1973-1975. 

Ela foi agraciada com diversos prêmios e distinções ao longo da carreira, como o Grau de Officier des Palmes Académiques, condecoração do governo francês (1971), a Medalha de Ouro Santos Dumont, do governo de Minas (1986), a Ordem Nacional do Mérito Científico, categoria Grão Cruz, da Presidência da República (1998), e a Medalha Mendes Pimentel, da UFMG (2012).

Viúva há mais de 30 anos de Wilson Coelho Leão, a professora Ângela deixou cinco filhos (Athos, Mário, Beatriz, Regina e Ângela Maria), 10 netos e 11 bisnetos.

O velório de Ângela ocorreu nesta segunda-feira, dia 4, das 10 às 14 horas, no Cemitério do Bonfim (capela 1), e o sepultamento foi em seguida, no mesmo cemitério.

Em homenagem às mulheres em março de 2007, o Governo de Minas colocou Ângela Vaz Leão entre as que mais marcaram a história do país