Opinião: Sendo trabalhadora rural, requereu o benefício do salário-maternidade
Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)
Cresceu na zona rural e nunca saiu de lá. Tornou-se lavradora como os pais. Desde cedo, cuidava da plantação de verduras que, todos os finais de semana, levavam para vender na feira da cidade. As suas mãos calejadas eram evidência da dura luta na roça. Os frutos do que plantavam eram suficientes para se manterem e comprarem, vez ou outra, uma roupa. Ter pouca roupa não era um problema... nem tantos lugares aonde ir havia por ali.
Nunca sentiu que havia algo de errado naquele seu destino, ou almejou uma vida diferente. Sua sorte foi encontrar alguém que também se amoldara à vida no campo. Casou-se logo, porque gente da roça não delonga o que o destino lhes põe diante dos olhos. Quase um ano depois, nasceu o primeiro filho. A situação financeira ficou crítica, mesmo tendo feito uma pequena reserva com o trabalho que realizou até às vésperas do parto. Com a chegada do bebê, foi obrigada a parar a fim de cuidar dele. Só o trabalho do marido não rendia o suficiente para cobrir todas as despesas.
É isso que ouço, quando, ao visitar a terra onde nasci, vou até a casa dela. Quis ir até lá, porque ali perto se encontravam as ruínas da casa onde vivi os primeiros anos de minha infância. Diante do relato dela, pergunto se está recebendo o salário-maternidade. Responde que nem pensou nisso, porque nunca teve carteira de trabalho assinada.
Explico-lhe que, como mulher dedicada à agricultura familiar, o INSS a considera uma segurada especial. Como tal, não precisa ter carteira assinada ou contribuir para a Previdência Social para ter acesso ao benefício do salário-maternidade. O que precisa é comprovar ter exercido atividade rural por pelo menos dez meses antes do parto. Saliento que, mesmo já tendo nascido o bebê, ainda está em tempo de requerer o benefício.
Se conseguir comprovar seu trabalho como lavradora durante o tempo estabelecido como critério pelo INSS, receberá o benefício de um salário mínimo durante 120 dias. Ela acha difícil a aprovação do pedido, porque não tem como apresentar documentos que comprovem seu direito
Digo-lhe que, pelo que sei da vida dela, é uma pessoa cujo trabalho rural se enquadra no da economia familiar, ou seja, aquele trabalho indispensável para a própria subsistência realizado pelos membros da família, em mútua colaboração, sem ter empregados permanentes.
Ela me fala que tem testemunhas de que sempre exerceu essas atividades e me pergunta se isso serve para provar seu direito. Respondo-lhe que a prova testemunhal não é o bastante para obter o benefício, a não ser que haja um motivo de força maior ou caso extraordinário. A atividade rural do segurado especial tem de ser comprovada também pelo que se conhece como início de prova material.
Peço que me mostre a sua certidão de nascimento e a certidão de nascimento do menino. Vejo que, na dela, está registrado que seus pais são lavradores, e que, na do filho, consta que ela, mãe, é lavradora. Isso já é um bom começo de evidências. De acordo com o Superior Tribunal de Justiça, os dados constantes das certidões da vida civil servem como início de prova material da condição de trabalhador rural nos requerimentos de benefícios previdenciários.
Pergunto se tem algum registro de compra ou algum contrato em que conste sua profissão como trabalhadora rural. Ela me diz que precisará verificar isso. Digo-lhe que, se encontrar algo assim, será muito importante para comprovar seu direito. Além disso, precisará assinar um documento no qual declare que trabalhou como trabalhadora rural desde o ano tal.
Tudo isso, além da indicação de testemunhas, será juntado ao requerimento feito ao INSS. Se aprovado, ela receberá o benefício desde a data do nascimento do filho. Receberá também um abono anual, correspondente ao período de duração do salário-maternidade, pago com a última parcela do benefício.
Ela se anima e agradece a bênção da minha visita. Diz que foi a Providência Divina que me fez ir até a casa dela. Não duvido.
Maria Lucia de Oliveira Andrade
maluoliveiraadv201322@gmail.com
Membro da Academia Formiguense de Letras