Opinião: Manhãs de domingo em Formiga

Lúcia Helena Fiúza (de Palmas/TO)

Opinião: Manhãs de domingo em Formiga
Lúcia Helena Fiúza é professora aposentada




A gente não sabe se o nome era por causa do Cine Glória, que ficava em frente, na Rua Barão de Piumhi, mas a Pastelaria Glória era uma passagem obrigatória antes dos filmes da série de faroeste do Durango Kid que o professor Franklin de Carvalho passava nas manhãs de domingo.

Minha irmã Cecília não ia, dizia que era coisa de criança, mas eu e meu irmão Toninho Maria, dois anos mais novo que eu, não perdíamos. A gente levantava cedo, descia do Rosário, ia para a missa das oito do Padre Cornélio, de lá corríamos pela Praça São Vicente Férrer e tentávamos subir em umas palmeiras de uma espécie que tinha caules finos que nasciam curvos, eram três ou quatro na mesma muda. Nunca conseguimos

De lá e em festa, descíamos pela Rua do Fórum, dávamos um “oi” para Dona Bia, que morava em frente à Sorveteria Skimó; Doutor Juca e Dona Edimée também já estavam na janela. Quase sempre, parávamos em frente à Funerária do Sylvio Rocha onde eram colocados os convites dos enterros do dia. Se tivesse defunto conhecido, a gente contava em casa.

Passávamos em frente ao Bar Tropical, na Praça Getúlio Vargas, onde O Dico Cambista conferia os bilhetes de loteria com alguns conhecidos que tiveram de incorporar o nome da mãe ou o da esposa ao seu. Geralmente estavam o Nego da Liquinha, o Messias da Ivete, o Mariano da Ducarmo, o Sílvio da Donana, o Olavo da Marilene e o Darci da Darci. O Darci da Darci era um senhor do Rio de Janeiro que chegou a Formiga e acabou se casando com uma senhora de nome igual.

Virando à esquerda depois da praça, membros de uma conceituada e respeitada família, a Pereira da Costa, já estava com a Pastelaria Glória aberta. Luizinho da Laíde ficava fritando pastéis de carne e de queijo atrás de um tapume de vidro com óleo escorrendo, o vidro dividia o fogão com um panelão dos clientes. Havia um balcão de fórmica azul e branca com banquetas de ferro e madeira fixas no chão, que era de ladrilho vermelho quebrado, moda na época. Em frente à parte lateral do balcão, havia um corredorzinho com mesas e cadeira de fórmica igual. Quem fosse aos banheiros tinha de desviar de engradados de madeira do guaraná-champanhe Antártica que ficavam empilhados.

Quando se entrava na pastelaria, a gente dava de frente a uma máquina de suco de laranja, nem sei se ainda existem iguais. Ela era como se fosse um liquidificador quadrado, mas um liquidificador grande, ficava ligada e o suco subia por um tubo, batia na tampa e escorria pelas laterais, estava sempre geladinho.

Eu e Toninho chegávamos e procurávamos um lugar de onde dava para ver a porta do cinema. Como ele era mais novo, tinha de me obedecer porque eu era orientada a “tomar conta”. Eu o deixava sentado e pedia pro Luizinho dois pastéis de carne, eles vinham com uma azeitona dentro, e dois copos de suco de laranja.

Como o movimento era grande, demorava um pouco. Então, eu atravessava a rua e ia pra fila comprar os ingressos. Quando voltava, já estavam na mesa os pastéis em um pratinho branco de papelão com guardanapo, e os sucos, que eram servidos em copos tipo Lagoinha, mas com dobro do tamanho.

Toninho dava uma bilosca no pastel para a carne moída e a azeitona descerem. Mordia nas duas pontas de cima e soprava em uma para o ar quente sair pela outra. Ficávamos de olho, quando o Wilson, um policial militar que fazia bico no cinema para ajudar seu irmão, que era o porteiro oficial, colocava a roleta para funcionar, nós já estávamos no finalzinho do pastel e do suco.

Antes de entrarmos, comprávamos pipocas no carrinho da Dona Luzia do Seu Boa Vida. Ela colocava a pipoca no saquinho de papel com uma conchinha de metal com a boca chanfrada e batia duas vezes com o fundo para caber mais.

Logo depois da roleta, havia uma galeria com cartazes de filmes que passariam nos próximos dias. Ao lado direito, um pequeno guichê vendia guloseimas como balas, suspiros e marias-moles. Uma senhora de cabelos curtos atendia.  Toninho sempre pedia uma espécie de maria-mole que vinha imitando sorvete em uma casquinha, eu gostava era de um pacotinho de “balas bem sortidas”.

Ficávamos na fileira de cadeiras do lado direito, pertinho da saída que tinha uma porta de correr sanfonada, tipo das de elevadores antigos, que dava para a Rua Pio XII. Batíamos palmas e dávamos gritos entusiasmados assim que algum vilão ou índio morria quando o Durango Kid do alto de seu cavalo branco e máscara preta feita de lenço acertava na mosca. No finalzinho do episódio, o Wilson chegava e abria a cortina grossa que servia como blackout. O barulho das argolas de ferro escorregando pelo cano que servia de trilho era uma senha avisando que a fita estava acabando.

Éramos os primeiros a sair. Voltávamos para casa subindo o Beco Protestante, depois, Praça da Matriz e Praça do Colégio Santa Terezinha. Passávamos em frente ao Cemitério do Rosário e entrávamos em casa prontos para as broncas da mamãe. Depois de pastel, suco de laranja, pipoca, maria-mole na casquinha de sorvete e um saco de balas bem sortidas, quem iria conseguir almoçar?

A gente não sabe se o nome era por causa do Cine Glória, que ficava em frente, na Rua Barão de Piumhi, mas a Pastelaria Glória era uma passagem obrigatória antes dos filmes da série de faroeste do Durango Kid que o professor Franklin de Carvalho passava nas manhãs de domingo.

Minha irmã Cecília não ia, dizia que era coisa de criança, mas eu e meu irmão Toninho Maria, dois anos mais novo que eu, não perdíamos. A gente levantava cedo, descia do Rosário, ia para a missa das oito do Padre Cornélio, de lá corríamos pela Praça São Vicente Férrer e tentávamos subir em umas palmeiras de uma espécie que tinha caules finos que nasciam curvos, eram três ou quatro na mesma muda. Nunca conseguimos

De lá e em festa, descíamos pela Rua do Fórum, dávamos um “oi” para Dona Bia, que morava em frente à Sorveteria Skimó; Doutor Juca e Dona Edimée também já estavam na janela. Quase sempre, parávamos em frente à Funerária do Sylvio Rocha onde eram colocados os convites dos enterros do dia. Se tivesse defunto conhecido, a gente contava em casa.

Passávamos em frente ao Bar Tropical, na Praça Getúlio Vargas, onde O Dico Cambista conferia os bilhetes de loteria com alguns conhecidos que tiveram de incorporar o nome da mãe ou o da esposa ao seu. Geralmente estavam o Nego da Liquinha, o Messias da Ivete, o Mariano da Ducarmo, o Sílvio da Donana, o Olavo da Marilene e o Darci da Darci. O Darci da Darci era um senhor do Rio de Janeiro que chegou a Formiga e acabou se casando com uma senhora de nome igual.

Virando à esquerda depois da praça, membros de uma conceituada e respeitada família, a Pereira da Costa, já estava com a Pastelaria Glória aberta. Luizinho da Laíde ficava fritando pastéis de carne e de queijo atrás de um tapume de vidro com óleo escorrendo, o vidro dividia o fogão com um panelão dos clientes. Havia um balcão de fórmica azul e branca com banquetas de ferro e madeira fixas no chão, que era de ladrilho vermelho quebrado, moda na época. Em frente à parte lateral do balcão, havia um corredorzinho com mesas e cadeira de fórmica igual. Quem fosse aos banheiros tinha de desviar de engradados de madeira do guaraná-champanhe Antártica que ficavam empilhados.

Quando se entrava na pastelaria, a gente dava de frente a uma máquina de suco de laranja, nem sei se ainda existem iguais. Ela era como se fosse um liquidificador quadrado, mas um liquidificador grande, ficava ligada e o suco subia por um tubo, batia na tampa e escorria pelas laterais, estava sempre geladinho.

Eu e Toninho chegávamos e procurávamos um lugar de onde dava para ver a porta do cinema. Como ele era mais novo, tinha de me obedecer porque eu era orientada a “tomar conta”. Eu o deixava sentado e pedia pro Luizinho dois pastéis de carne, eles vinham com uma azeitona dentro, e dois copos de suco de laranja.

Como o movimento era grande, demorava um pouco. Então, eu atravessava a rua e ia pra fila comprar os ingressos. Quando voltava, já estavam na mesa os pastéis em um pratinho branco de papelão com guardanapo, e os sucos, que eram servidos em copos tipo Lagoinha, mas com dobro do tamanho.

Toninho dava uma bilosca no pastel para a carne moída e a azeitona descerem. Mordia nas duas pontas de cima e soprava em uma para o ar quente sair pela outra. Ficávamos de olho, quando o Wilson, um policial militar que fazia bico no cinema para ajudar seu irmão, que era o porteiro oficial, colocava a roleta para funcionar, nós já estávamos no finalzinho do pastel e do suco.

Antes de entrarmos, comprávamos pipocas no carrinho da Dona Luzia do Seu Boa Vida. Ela colocava a pipoca no saquinho de papel com uma conchinha de metal com a boca chanfrada e batia duas vezes com o fundo para caber mais.

Logo depois da roleta, havia uma galeria com cartazes de filmes que passariam nos próximos dias. Ao lado direito, um pequeno guichê vendia guloseimas como balas, suspiros e marias-moles. Uma senhora de cabelos curtos atendia.  Toninho sempre pedia uma espécie de maria-mole que vinha imitando sorvete em uma casquinha, eu gostava era de um pacotinho de “balas bem sortidas”.

Ficávamos na fileira de cadeiras do lado direito, pertinho da saída que tinha uma porta de correr sanfonada, tipo das de elevadores antigos, que dava para a Rua Pio XII. Batíamos palmas e dávamos gritos entusiasmados assim que algum vilão ou índio morria quando o Durango Kid do alto de seu cavalo branco e máscara preta feita de lenço acertava na mosca. No finalzinho do episódio, o Wilson chegava e abria a cortina grossa que servia como blackout. O barulho das argolas de ferro escorregando pelo cano que servia de trilho era uma senha avisando que a fita estava acabando.

Éramos os primeiros a sair. Voltávamos para casa subindo o Beco Protestante, depois, Praça da Matriz e Praça do Colégio Santa Terezinha. Passávamos em frente ao Cemitério do Rosário e entrávamos em casa prontos para as broncas da mamãe. Depois de pastel, suco de laranja, pipoca, maria-mole na casquinha de sorvete e um saco de balas bem sortidas, quem iria conseguir almoçar?