Opinião: Waltinho Carabina, um cabo eleitoral em Formiga

Lúcia Helena Fiúza (de Palmas/TO)

Opinião: Waltinho Carabina, um cabo eleitoral em Formiga
Lúcia Helena Fiúza é professora aposentada




“É necessário sair da ilha para ver a ilha”, quem disse foi o escritor português José Saramago. A frase faz parte de um conto e fica um tanto quanto desprovida de seu sentido quando pinçada e tirada de seu contexto, mas vou fazer isso.

Tive de ir embora de Formiga para poder ver a beleza da cidade, de seus costumes e, principalmente, de sua política. Lembro-me de vários e famosos e eficientes cabos eleitorais, alguns foram amigos de papai, o Seu Coló.

Das várias passagens, tem uma que já usei até como exemplo em salas de aula em colégios de Belo Horizonte.

Era um sábado de manhã e papai tinha ido à casa de um advogado que morava em frente à Prefeitura, se chama Ovídio de Faria, para buscar um determinado papel. Lá, ele se encontrou com um saudoso amigo que morava ao lado de nossa casa na Rua Nova, o José Sílvio.

Ele era juiz de futebol, tinha trabalhado por anos na Polícia Civil, mas que estava emprestado para a Prefeitura. Com eles, um rapaz que o prefeito Ninico Resende havia acabado de trazer de Belo Horizonte para trabalhar com ele, se chama Walter Balduíno Nunes, mas atendia pelo curioso apelido de Waltinho Carabina. Em poucos instantes, já eram amigos de infância.

Carabina, como papai o chamava, era um daqueles cabos eleitorais que se entregavam à causa, fiel até mandar parar. Andava por todo canto com Ninico, era um assessor tipo ajudante de ordens.

Há uma do Waltinho Carabina que é muito interessante e curiosa e que muito bem representa o que foi a política na cidade no final dos anos 1970.

Havia um senhor que trabalhava na Cooperativa dos Fazendeiros e que organizava os ternos de congado na Igreja do Rosário. Não sei nome real, mas todo mundo o chamava de Seu Didi. Haveria uma festança danada com ternos vindos de Itapecerica, Divinópolis, Bom Despacho e até de Uberlândia, e seu Didi foi à Prefeitura pedir a Ninico que ele mandasse servidores dar uma guaribada na rua em frente à Igreja do Rosário, que era de terra, e dar um tapa na praça logo em frente que estava com os passeios quebrados. No dia da festança, os ônibus foram chegando, o lugar enchendo e tudo numa sujeira danada, daquelas de dar vergonha.

Indo ver o movimento, papai e Carabina pararam para conversar com Thieca, marido da Dona Nina que morava em frente ao Cemitério, que estava na janela, quando de longe viram o Seu Didi xingando Ninico. Era um palavrão atrás do outro, cada um mais criativo do que o outro.

Ao ver que uma rodinha estava se formando em volta do reclamante, Waltinho chegou perto e puxou Seu Didi pelo braço. Perto de papai, ele disse que a culpa era dele: “Pois é, o Ninico me disse: Waltinho, passa na Secretaria de Obras, pegue uns oito ou nove servidores, vai lá e faz tudo que o Didi quiser. E eu me esqueci. Desculpa, pelo amor de Deus, se o Ninico souber que eu não me lembrei vai ficar bravo demais comigo. Fale com ele não”.

No mesmo momento, a raiva que Seu Didi estava de Ninico passou a ter Waltinho Carabina como alvo: “Como é que você faz isso comigo, e eu aqui falando mal do coitado do Ninico que nem está sabendo de nada”.

Waltinho saiu da roda, deu uma piscadela pro meu pai e os dois foram para o Bar do Silvino, onde José Sílvio esperava com uma Brahma geladíssima e uma panelada de pés de porco.

No outro dia, ele contou tudo a Ninico que, passando a mão na cabeça, mandou que o secretário Amri Diniz fizesse uma verdadeira força tarefa para deixar a praça nos trinks.

Seu Didi nunca tocou no assunto com Ninico e Waltinho ganhou pontos como um cabo eleitoral eficiente e destemido.