Crônica: Dona Philomena
AC de Paula (de São Paulo/SP)
Como eu já evidenciei em outra crônica, é necessário que o corretor, gerente ou advogado que estiver tratando uma venda, tenha uma dose imensa de paciência e criatividade, dois elementos que podem fazer o diferencial entre fechar ou não uma transação. Um dia um corretor entra na minha sala e diz:
- Chefe, tem um abacaxi pra descascar, o meu cliente quer comprar o imóvel, já fez até proposta com outro corretor que só não conseguiu fechar pois o seu Walter, o proprietário, quando sabe que o comprador é o doutor Tominaga, aumenta o preço, pois diz que ele tem dinheiro e pode pagar o que ele quer!
O cliente era realmente um dentista muito conceituado e conhecido na região, e queria comprar um imóvel vizinho da sua clínica para expandir o consultório. Fui então com o corretor conversar com o comprador. Ele repetiu a história que o meu corretor já havia adiantado, quando o vendedor sabia que era ele o comprador, aumentava o preço!
Fiquei então imaginando uma forma de contornar aquela situação, a solução seria comprar em nome de outra pessoa, mas aí também daria problema, o vendedor poderia querer outorgar a escritura apenas para quem houvesse assinado o contrato particular. Então num estalo eu perguntei o nome da esposa do comprador, que não era de descendência nipônica, e fiquei sabendo que seu nome de solteira era Philomena Pallatto.
Não tive dúvidas preenchi a proposta de acordo com a condição do cliente e qualifiquei a esposa como proponente compradora, e ela é quem assinou a proposta. Fui posteriormente tratar com o proprietário que era daqueles duros na queda. Inclusive me deu um chá de cadeira, até me atender no salão de festas do seu prédio.
- Seu Antonio Carlos esta proposta não é do japonês? Não adianta eu não vou mexer no preço, ele tem que pagar o que eu quero!
Com a maior cara de pau do mundo eu retruquei:
- Pô seu Walter, o senhor já viu japonês chamar Filomena com ph?
Este argumento derrubou a primeira barreira, a outra era o preço que ele tinha na cabeça e do qual não queria arredar pé! Eu sabia que mesmo se levasse o valor que ele queria, ele não iria aceitar, por isso, insisti na tratativa da PS, pleiteando uma redução e ele foi curto e grosso. Levantou-se, subiu para o seu apartamento e me deixou falando sozinho!
Resolvi não insistir mais naquele dia, era melhor esfriar a cabeça e tentar uma nova investida. A grande vantagem da minha atuação como gerente em relação ao corretor, é que eu sempre tive frieza para não me deixar levar pela pressa, ansiedade, ou desespero para concluir uma venda! É preciso ser frio como jogador de pôquer e ágil como Bruce Lee!
No dia seguinte pela manhã eu já estava no prédio do senhor Walter, que é claro não tinha nenhuma boa vontade em me atender.
- Olha seu Antonio Carlos, não adianta vir com esta conversa de abaixar o preço, que eu não vendo! Não me custa nada deixar o senhor falando sozinho de novo!
- Calma se Walter, vamos conversar, nem o senhor nem eu vamos perder tempo! Eu também não tenho tempo a perder!
Apresentei então a nova proposta, quer dizer, a verdadeira proposta com o valor que ele pedia. Ele olhou pensou e tornou a dizer:
- Você tem certeza de que não é o japonês? Pra ele eu não vendo por este preço.
- Seu Walter eu já lhe mostrei ontem, está aí o nome da compradora, CPF, identidade, tudo!
Ele pensou, pensou e depois me disse, tudo bem, eu aceito, mas eu só pago a metade da comissão. É duro ter que admitir, mas às vezes, metade de alguma coisa é melhor do que cem por cento de nada! Fiz então com que ele e a esposa assinassem o aceite da proposta, assim ao menos alguma coisa já estava garantida. Já sai de lá com os documentos para preparar o contrato.
Marquei depois para conversar com o comprador e fui bem claro!
- O que o senhor disse realmente é verdade, para o senhor ele só vende se for por um valor bem maior do que ele pede. Mas eu consegui contornar a situação, só que o senhor vai ter que assumir metade do valor da comissão!
O comprador concordou em pagar a diferença em três parcelas e marcamos a assinatura do contrato, quando o senhor Walter deu de cara com a compradora e o marido, ficou vermelho de raiva, mas assinou, afinal ele e a esposa já haviam dado o aceite na proposta! Se ele não assinasse o contrato, teria que pagar a comissão.