Opinião: Brasil, em dias estranhos

Nirlei Maria de Oliveira (de Campinas/SP)

Opinião: Brasil, em dias estranhos
Nirlei Maria Oliveira é formiguense, escritora e bibliotecária




Escrevo-te hoje, logo após os ataques terroristas em Brasília.

O dia ainda nem começou e já fiz a minha caminhada diária. Preciso respirar o ar puro (mais ou menos puro), acho que isso nem existe na cidade grande, mas enfim, respiro o ar que tem disponível nestas horas.

Caminhar me traz senso de realidade e das urgências do cotidiano, como lavar roupa da semana e limpar a cozinha. Mas a minha mente está como um caldeirão em fervura, não consigo desconectar das imagens veiculadas na tv.

Meus sentimentos estão entre a indignação e a vergonha. Não sei se é um dia bom para a poesia ou a prosa. Acho que somente para a reflexão. Sei que a escrita me salva em dias ruins e bons! Mas sentimentos estranhos afloram e preciso dar vazão ao que tanto me incomoda.

Ontem algo dentro de mim se quebrou, espatifou-se de vez — a crença que o povo brasileiro é pacifico (sou muito ingênua, eu sei). Atos gravíssimos contra a democracia, algo que nunca esperei ver. Talvez em filmes de ação americanos. Gosto de uma boa ficção.

Mas a realidade bateu e bate na nossa cara e com força e sem piedade: depredação de patrimônio público, terrorismo e vandalismo ao vivo e cores. Não dá para passar pano, justificar, ou achar que são crianças malvadas brincando com seus videogames.

O buraco é mais embaixo: algo podre foi chocado por anos, em banho-maria e eclodiu - um ninho de serpentes. Não é fácil interpretar o país, são raízes profundas e adormecidas que vêm à tona!

Quem somos afinal, enquanto povo brasileiro? Não sei a resposta. Mas parece que temos um discurso destoante da realidade e das análises que precisarão de revisão histórica. Quem é o cidadão de bem, zeloso da moral e dos bons costumes? Não me conte, por favor. Me poupe: de ouvir frases de efeito para postar em redes sociais.

Por mais que ações sejam feitas do ponto de vista legal, e que sejam duras e exemplares, assim espero. Não há como negar, que existe um Brasil que precisamos encarar e entender. Uma população insatisfeita. Não há como fingir ou fugir desta realidade, desta trinca no mapa e da cissura na democracia.

Educação, cultura, leitura e poesia fortalecem a democracia — nisso que acredito. Era para ser apenas uma caminhada para desanuviar as ideias, quando tudo estava silencioso, apenas uns gatos perdidos, um pássaro ou outro batendo asas. Mas algo estava atravessado em minha garganta. Dia 8 de janeiro de 2023. Um dia para se lembrar e para não se repetir, assim penso. Viva a Democracia.