Opinião: Vou-me embora pra Pasárgada
Amilton Luiz Vale de FormigaMG
Vera, amiga, te odeio! Como foi me trair desse jeito, cravando no L? Sim, sei, nossa amizade está acima dessa meleca de política. Só que não precisava exagerar. Bom que o tempo passou e a raiva foi junto. Agora é buscar o lucro.
Seguinte. Sei tudo desse novo Brasil que se avizinha. E nem preciso ser bidu porque li o programa deles. Nada de preocupado comigo, que já estou no ontem-futebol-clube, desde que não sequestrem minha aposentadoria e nem mexam nos meus remédios.
Não sou cego. Estou nos restos de vida e preciso tirar algum proveito. Você sabe tudo, votou porque leu na mesma bíblia. E é eleitora ciente e consciente. Ele disse claro: vai mexer na tal de herança e no compartilhamento de moradia.
Preciso sair no lucro. Me ajude a pensar: minha moradia é típica casa de vó. Final de semana, o bicho pega, custa sobrar pedaço pras namoradas. Será que não consigo provar que está tudo ocupado mesmo que só no final de semana?
Será que vou poder colocar colchão na cozinha? Tem mais: esse tal povo pobre costuma ter carro. Vou ter que deixar meu carro na rua? Veja que são dúvidas pontuais e eu sonho sair bem na fita.
Não sei se é hora, mas já queria negociar a vinda de mãe sem pai e acompanhada de 5 filhos abaixo dos seis anos. A ser verdade – e tomara que seja - confira comigo as contas. Imagina só: em cada quarto, mãe e cinco filhos. Total: 600 + 750 = 1350,00. Se tenho 4 quartos, conta fácil: 5.400.00. Putz! Sem falar que vou poder dispensar cozinheira e faxineira. Bom demais pra ser verdade. É negócio da China! Melhor que aposentadoria.
Pergunte pra mim, que dia começa isso. E olha que meu lucro pode crescer porque tenho espaço na casa das filhas e uma mansão de campo que só dá despesa. Não vejo hora de recepcionar esse povo querido.
Nossa! Estava esquecendo a tal de herança. Será isso? Morreu, o governo mete seus bens no bolso e distribui pros pobres. Só precisa ficar claro se é no bolso deles, como é o costume. A ser verdade, vendo tudo, boto filhas, genros e netos no saco, peço licença a Manuel Bandeira e “vou-me embora pra Pasárgada. Lá sou amigo do rei. Lá tenho a mulher que eu quero”.
Se ficar boazinha, quem sabe, te levo junto.
Beijo chocho de amigo ainda magoado.