Crônica: 'Ninguém se alói'

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: 'Ninguém se alói'
Manoel Gandra é poeta e jornalista




Esta é da década de 50 e o saudoso Comendador Osório Garcia jurava que aconteceu na Câmara Municipal de Formiga, mas tem gente que fala que foi em outra cidade. Porém, o que vale é a versão do Comendador, já que ele privilegiava o Legislativo da Cidade das Areias Brancas.

Contava o Comendador que a Câmara da cidade era dividida em duas alas, a dos intelectuais e estudados, que tinha o médico Vicente de Paula Vaz (Doutor Filhinho) como líder, e a dos ruralistas, tendo à frente o folclórico João Dias.

Em um dos fumegantes encontros, houve atrito entre as alas. Dois expoentes (que o Comendador, por educação, garantia que não eram nem Doutor Filhinho nem João Dias) quase chegaram às vias de fato.

Na tumultuada reunião plenária, o estudado da cidade fez uma inflamada reclamação da ala ruralista e gastou no vernáculo:

__Ouça-me. Vossa excelência está usando de subterfúgios para não ter de explanar como conseguiu recursos para continuar se deleitando. Acredito que há indícios de malversação do erário.

Achando que foi muito mais ofendido do que foi, o ruralista deu um tapa na mesa e partiu pra cima do estudado:

__Se vossa excelência falar de novo da minha excelência, eu vou mostrar que eu já tô arriando a guaiaca...

Para resolver a situação e temendo que os dois parlamentares chegassem ao confronto corporal, o presidente da Casa, que não era nem da roça nem muito letrado, dá o ultimato:

__Ninguém se alói do lugar, ninguém se alói do lugar. Pelo amor do Santíssimo, quando nóis se arreúne é pra se arreuní sem mau querência. Se alguém se aluí eu sungo a runião.

Como ninguém se aloiu, a runião não foi sungada. Depois dos trabalhos, eles voltaram a ser os mesmos amigos que sempre foram.

“Desde aquela época, os políticos já eram a mesma coisa”, dizia o Comendador.