Crônica: Sem força pra nada

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: Sem força pra nada
Manoel Gandra é poeta e jornalista




Nos anos 70, o radialista Aureliano Landico Pinto dominava as manhãs formiguenses pela “Difusora AM”. Certa vez, ele tinha de fazer uma viagem a Belo Horizonte e convidou o jornalista Wilson José para substituí-lo no programa “Casa de Caboclo”. A atração começava às 6 horas da matina. Em ponto. Landico ficaria fora por uma semana.
__Ô Landico, infelizmente eu não posso porque também vou viajar. Mas tem o Jackson Antônio, ele tem um programa à tarde, mas de manhã tá de folga. Eu falo com ele procê.
Ficou combinado. Jackson apresentaria os programas.
Quando foi na segunda-feira, Jackson saiu e cumpriu a obrigação. Seus pais, o sargento Vavá, também conhecido como professor Yukson - o Príncipe Indiano (o primeiro e único astrólogo genuinamente formiguense), e a Dona Célia Rocha, pularam cedo para ouvir o filho em novo horário.
Na terça-feira, o sargento Vavá entusiasmado correu para ligar o rádio, já estava batendo seis e meia, passou pelo quarto de Jackson e viu que ele estranhamente ainda estava dormindo:
__Uai Jackson, cê perdeu a hora?
__É que não tem força não, pai. Tá tudo sem força.
Preocupado, o pai do radialista comentou com sua esposa que o filho deveria estar muito doente, porque não tinha força nem pra se levantar. Correu e pegou um táxi e foi à casa do Doutor Afonso Henrique Braga, que ficava na Pracinha da Matriz, uns quatro quarteirões.
__Ô Doutor, só o senhor indo lá em casa pra mim. Meu menino tá muito mal. Tá sem força até pra levantar da cama.
Doutor Afonso foi de roupão mesmo. Dona Célia já tinha preparado um chá de funcho. Entram no quarto, pé ante pé, Doutor Afonso cutuca em Jackson, já colocando o termômetro para medir febre e o estetoscópio para ouvir o coração:
__Não mexe, não. Não mexe, não. Respire fundo. O que é que você está sentindo, dói onde? O que é que você comeu ontem?
Jackson deu um pulo da cama e se escondeu do lado da cômoda. Quando ele disse a seu pai que faltava força, estava querendo dizer que não havia energia elétrica no estúdio da “Difusora AM” e que, por isso, não haveria programa naquela manhã.
Wilson José conta que, a pedido de Jackson, o caso ficou escondido por muitos anos, “mas uma hora a gente tinha de contar”.