Opinião: Formiga e o perigo que ronda a ilha

Lúcia Helena Fiúza (de Belo Horizonte/MG)

Opinião: Formiga e o perigo que ronda a ilha
Lúcia Helena Fiúza é professora aposentada




Não tenho certeza quem afirmou, mas é a mais pura verdade: “Para ver a ilha, é preciso sair da ilha”. Não sei se a frase literal é assim, mas é preciso refletir sobre ela.

Por anos, eu ouço pessoas que nasceram ou moram em Formiga falarem mal da cidade, dizendo que as oportunidades são poucas, que outros municípios crescem mais e que grandes comerciantes da cidade, historicamente, impedem a instalação de empresas vindas de fora. Pura bobagem, é preciso sair de Formiga para se ter noção do que ela realmente é, do seu poder e de sua força.

Recentemente, tenho acompanhado por redes sociais alguns jovens criticando a cidade e enumerando o que falta nela. Dizem que as oportunidades são poucas e que a MG-050 é o melhor caminho, é uma pena pensarem assim.

Depois que saí das Areias Brancas, passei a ver as coisas com mais nitidez, é como se afastar para dar perspectiva. Dizem que em Formiga as indústrias são poucas, mas não atentam para o fato de que nenhuma outra cidade do mesmo porte no interior mineiro ter um comércio mais pujante e diversificado. Na área de saúde, há as melhores clínicas, os melhores profissionais e praticamente todas as especialidades. Na cultura, artistas e ativistas nas mais diversas áreas. De tão rica e bonita, a Festa do Rosário que aconteceu no último final de semana (e eu não vi nenhum dos reclamantes prestigiando) é de passar em documentários na Europa, as folias de reis emocionam a cada tirada. Constantes são festivais musicais e gastronômicos, a feira hippie, tudo indica que se firmou. Clubes sociais dos mais belos, bares e restaurantes com música ao vivo de alta qualidade, Centro Universitário de excelência, Instituto Federal de referência e um povo lindo, gentil e bronzeado pelo sol da orla do Lago de Furnas compõem a tela emoldurada pela Matriz São Vicente Férrer e pelo Morro do Cristo.

O que é preciso ser focado por quem resmunga é que os resmungos devem ser direcionados para onde eles realmente se fazem necessários. A pessoa quando está fora da ilha, como que é o meu caso, vê melhor onde o coqueiro precisa de adubo.

Durante anos, as coisas aconteciam mais ou menos assim: papai e mamãe quando precisavam de um fogão ou aparelho doméstico, eles iam ao Seu Mirabeau, à Casa Cruzeiro, à Mobiliar ou ao Bazar Guri, faziam orçamento, compravam, pagavam e o dinheiro ficava em Formiga. Se iam fazer as compras do mês, era no Kit Sacolão, no Peg-Lev ou em algum armazém com os proprietários conhecidos e moradores da cidade. Compravam, o dono recebia e o dinheiro já estava na conta em algum banco no centro. Dali só saia para ser investido em obras e empreendimentos na própria cidade.

Alguém adoecia e era só procurar o Moisés, o Rubinho ou o Sebastião na Drogaria Santa Maria, o Paschoal na Drogaria Santa Luzia, o Otaviano da Farmácia ou um experiente atendente da Farmácia Wagner. Os donos das farmácias e drogarias, como eram moradores de Formiga, gastavam em outros estabelecimentos comerciais da cidade e o dinheiro ficava próximo ao Mata-Cavalo.

Agora, qualquer formiguense que for comprar uma televisão ou geladeira irá fazer negócio com alguma rede nacional ou estadual que se instalou, que vai receber o dinheiro, levar e investir bem longe.

As compras de mantimentos estão cada vez mais dominadas por grandes supermercados. As pequenas mercearias e armazéns familiares, aqueles que ainda têm a caderneta para anotar, estão fadadas a desaparecer. Na semana passada, me contaram que haverá mais um atacarejo na região da Avenida Brasil e que um grupo daqueles de televisão está construindo uma unidade gigante na Avenida Vereador José Higino Filho, na saída para Campo Belo. O pior é que esses grandes supermercados também têm alas para vender pães e carnes. Com o tempo, vão quebrar não só as mercearias, mas também açougues e padarias.

As lojas de departamentos também estão chegando. Quem comprava roupas e tecidos na Casa Santo Antônio, na Nova América e na César Confecções, todas empresas formiguenses, não terão opções. É ir ao caixa, passar o cartão ou o pix e os números cairão em alguma conta que não é na cidade.

As farmácias e drogarias dos simpáticos balconistas amigos estão sendo engolidas por conglomerados. Sobrevivem só as que se unem a eles.

Para não empobrecer, Formiga já pode ir pensando em algum caminho para trilhar em um futuro não tão distante. Há alguma coisa estranha apontando no horizonte do outro lado da ilha. E não é boa.