Poesias: Uma sementinha
Ana Pamplona (de Formiga)
Dormia no interior do campo
desde a estação do inverno
quando foi acordada por um forte e incômodo canto
atingiu-a como solapada
ainda adormecida e por tanto tempo
hibernando não esperava ser despertada
abriu os olhos sujos de terra
procurou ao redor o autor que a invocava
para iniciar uma guerra
olhando para trás e para frente
procurando de lá para cá a ninguém encontra
por mais que procure e tente
apareceu-lhe então um tico-tico
— você que me chama? pergunta a semente
“não”, disse ele com um galho no bico
“mas sei quem te invoca”, acrescentou
— quem ousa me molestar?
“ninguém te molesta, é a primavera que chegou”
— primavera fala e incomoda assim?
“sim, ela canta, ela chama, é a força
que convida a germinar e frutificar enfim”
— creio não poder, amigo
prefiro no seio seguro da terra permanecer
será desta forma que sigo
tico-tico suspirou e voou
mas o canto continuou a ressoar na semente
até que um dia incomodou
ouviu então uma vozinha dizer
“permanecendo assim alguém te arrancará do solo
e você vai perecer”
gritou a sementinha: — não vou, não quero morrer!
Ela então se encorajou e inchou
para a terra suas raízes começaram a escorrer
brotaram ramos em direção ao céu
o sol viu aparecerem seus brotos
a chuva acariciou suas flores de mel
Vieram os frutos e a linda plantinha
pediu ao vento que durante a colheita
espalhasse sua sementinha.