Crônica: MEDRA

AC de Paula (de São Paulo)

Crônica: MEDRA
AC de Paula é dramaturgo, poeta e compositor




Eu já levei porradas deste mundo, mas a caminhada sempre foi mais importante do que as pedras da estrada. Superação é o mantra de quem quer chegar a um objetivo, claro que é mais fácil falar do que praticar, mas é caminhando que se faz o caminho. Não há glória e conquista sem luta e contratempos, nem sempre nos sopram, da bonança, os ventos, mas é aí que deve prevalecer a esperança. Cair pode acontecer a qualquer um, mas se reerguer, alçar voo novamente, é só para os fortes. O campeão sabe bem que beijar a lona é como beijar a morte, por isso ele se recupera e, contrariando a expectativa, os traumas supera.

A intensidade da energia vibratória da conquista e da vitória é de fato reconfortante e gratificante, o desalento da queda é inesquecível, muito embora deva ser superado e sempre servirá como um sinal de alerta, ninguém esquece quando apanha. Já chutei de pé trocado, mas dei conta do recado, não há amor sem pecado, não vou chover no molhado a verdade é inconteste. E quem passou pelo teste pode atentar ao que eu digo, vai além do próprio umbigo a verdade verdadeira. Se a pontaria é certeira e a seta encontra o alvo, cumpriu-se o objetivo, e não há um lenitivo que mude a situação. 

Certo, errado ou mais ou menos, isso é tudo o que temos, quando não temos mais nada, e a poeira da estrada nos entope as narinas, e o poeta se queda em rimas, não cheira e nem fede, quando a inspiração se perde na quebrada das esquinas. Sem líricos pensamentos, só retalhos de momentos remendados de saudade. Dura e crua realidade travestida de poema, transgênica tentativa de captar sentimentos. 

Um dia chutei o balde, pedras, latas e estrelas, desilusões, melhor tê-las do que jamais ter sonhado. Viver é correr o risco, mas entre o traço e o rabisco, eu nem sequer me arrisco a tecer opinião. Polêmicas não me agradam nem sustentam opiniões, quem tem as próprias razões, delas não abre mão, quem tem alucinações se julga puro e santo e jura ter corpo são. Não me apraz deblaterar, dizia um poeta amigo, e hoje também lhes digo, no tal balaio de gato não me faço de gaiato, me resguardo e me recato, como manda o figurino. Nem tanto o céu e nem só a terra, mas o homem faz a guerra por não ter o que fazer? Ou a sede do poder feito um dilúvio moderno, transforma a paz em inferno como se costuma ver? Se alguém souber a resposta, que atire a primeira pedra, mas nas mentes enlouquecidas que povoam o universo, a incoerência medra.