Opinião: A árvore de Livro
Ana Pamplona (de Formiga)
(especial para a criança que mora em você)
Bem pequenina ainda, Cecília ganhou um livro. Falava de um menino que era amigo de uma árvore. Aquela amiga ouvia-lhe diariamente suas queixas, as alegrias, as dúvidas, aconselhava... E ao final da história, o menino sofreu muito, quando, sem piedade alguma, os adultos cortaram sua árvore.
Cecília ficou tocada pela estória. Ela dormia e acordava com seu livro. Resolveu que também queria uma árvore. E prometeu a si mesma, que jamais deixaria alguém cortá-la. Pediu sua mãe para comprar uma para si.
Certo dia, sua mãe chegou e entregou-lhe uma semente. Cecília não entendeu.
— Mãe, eu lhe pedi uma árvore...
Então sua mãe explicou-lhe que toda árvore vem de uma semente. E que, apesar de pequenina, já continha todos os potenciais dela. Ensinou-lhe como plantar. Cecília assim o fez.
A menina aguardou o surgimento da planta, mas impacientou-se com a demora dela para crescer e dar flores e frutos. Mesmo assim, decidiu conversar com ela todos os dias, como fazia o menino do livro. Entretanto, para sua decepção, a amiguinha nunca respondia. Sequer sabia se ela a ouvia. Cecília imaginou que aquilo se devia à pouca idade da planta. Afinal, as pessoas começavam a falar depois de um certo tempo de crescidas. Talvez fosse assim também com as plantas. Então persistiu em sua saga de ter uma confidente verdinha.
Num desses dias de conversas unilaterais, Cecília deitou-se ao lado da sua árvore-criança enquanto contava-lhe um caso da escola. Dali a pouco, suas pálpebras começaram a pesar. Curiosamente, a mudinha que não parecia nem lhe escutar, respondeu! A menina, então, falou sem parar e a amiga lhe respondia pacientemente com sua “vozinha verde”:
— “Sim”... “não”... “por que?”... “Isso”... “aquilo”...
Depois de muito falar e ouvir, Cecília perguntou à mudinha se todo mundo nasce de semente como ela.
— “Sim, todo mundo” — respondeu a arvorezinha.
Cecília lembrou-se do seu livro. Então perguntou onde estaria a semente de um livro.
— Onde compra? Como planta?
Para o espanto da menina, a mudinha esticou um dos seus pequeninos galhos e o encostou em sua testa:
— “A semente do livro está aqui” — “e também aqui” — disse apontando para o coração da dela.
Na mesma hora o rosto da menina iluminou-se. E ela riu alto, tão alto que acordou! Piscou os olhinhos ainda pesados do sono e viu a plantinha ao seu lado, impassível, quietinha, com todos os galhos em seus devidos lugares. Ficou em dúvida se a amiguinha verde realmente havia falado com ela ou se tinha apenas sonhado.
No entanto, naquele momento este fato não importava. Pois ela havia entendido algo incrível: que a semente de um livro não se compra, ela está dentro de nós, mora na nossa inteligência, na nossa vontade, na criatividade e no amor! E que uma semente de livro não se planta na terra, mas no papel. Era preciso tirá-la da cabeça e do coração e então, escrever!
Imediatamente, Cecília procurou um caderno, um lápis e um lugar para escrever. Ali ela plantou sua primeira semente da escrita, mergulhando naquela dimensão íntima e, infantilmente, fez nascer seu primeiro livro: “A Árvore de Livro”.
E foi assim que, depois de uma apoteótica conversa com sua mudinha-que-não-era-muda, Cecília apaixonou-se pela escrita, transformou-se em escritora e passou a semear pelo mundo, o amor pelo livro.
Ela só não contou a esta autora, se a árvore continuou a conversar...