Opinião: Centro Espírita ‘São’ Lázaro

Lúcia Helena Fiúza (de Belo Horizonte)

Opinião: Centro Espírita ‘São’ Lázaro
Lúcia Helena Fiúza é professora aposentada




Desde há muitos anos, eu alimento o sonho de voltar a morar em Formiga. Foi na cidade que vivi os momentos mais marcantes de minha vida, sejam eles melhores, piores ou curiosos. Saí em 1978 mas volto praticamente todo semestre. Uma boa parte das amizades que fiz mantenho até hoje e meus parentes sempre estão esperando com uma costelinha na lata ou um biscoito de polvilho escaldado.

O tempo passa e acaba sendo importante para darmos valor a momentos que pareceram simples, mas que na verdade foram exemplos de convivência harmoniosa que, com orgulho, carrego até hoje.

Relatar e discorrer sobre acontecimentos de tempos idos é, além de guardar os fatos para a eternidade, um delicioso exercício da lembrança.

Dias atrás, eu e minha irmã Cecília, hoje radicada em Araxá, conversávamos sobre acontecimentos que acreditamos que deveria ser compartilhado com todos.

Papai, Jair Fiúza da Cunha (Seu Coló) era funcionário da Rede Ferroviária Federal e desde que saiu de Iguatama, sua terra natal, teve a grande preocupação de formar uma família honesta, educada e capacitada para os desafios da vida. Dentro de suas possibilidades e recursos, chegou a intentos dos quais, nós, os filhos, desfrutamos.

No papo que tivemos, Cecília me fez recordar de histórias que estavam encostadas em algum canto da memória. Uma é muito interessante. Lá pelos fins dos anos 1960 quase 1970, se alguém queria um lugar de sucesso na sociedade, ele teria de saber datilografia. Fomos matriculadas, eu e minha irmã, em uma escola de datilografia (isso mesmo, em formiga existia escola de datilografia) que pertencia a uma simpática senhora de nome Irene. A escola funcionava em uma viela transversal à Rua General Carneiro, no inicinho da subida para o Cemitério da Chapada.

Naquele tempo, havia um deputado que vinha muito a Formiga que se chamava Joaquim de Melo Freire, Cecília disse que nunca se esqueceu do nome porque tinha um colega na Escola Normal que se chamava igual.

Em uma de suas passagens pela cidade, ele, que era de Passos, visitou várias entidades e se propôs a conseguir verbas junto ao Governo Estadual. Para dar início aos processos, ele deveria ter em mãos cópias das atas de fundação de cada uma delas. Voltaria dias depois para buscar. E foi aí que eu e Cecília entramos na história.

Não sabemos bem quem falou de nossos dotes, mas eu e ela fomos convocadas para datilografar as atas para o deputado. Me lembro que o Senhor Paulo Barbosa levou lá pra casa o livro de fundação da Sociedade São Vicente de Paulo, um outro senhor conhecido por João Paulo, o do Patronato São Luiz, e Seu Idelfonso Leão, o do Centro Espírita Lázaro.

Ficamos uns dois dias revezando em uma Remington novinha que ganhamos assim que recebemos o diploma da Dona Irene.

Depois de o trabalho pronto, papai resolveu dar uma revisão e acabou se deparando com uma situação interessante. No livro de atas do Centro Espírita Lázaro vem escrito que estava sendo fundado o Centro Espírita “SÃO” Lázaro. Papai logo se lembrou que “São” é coisa de santo da Igreja Católica, que no espiritismo não tem santo, foi logo avisando a Seu Idelfonso.

O que meu pai acreditava é que quando o Centro foi fundado, em 1928, os primeiros seguidores da doutrina temiam o preconceito da tradicional família católica formiguense e colocaram um “São” na frente de Lázaro para dar uma amenizada. Já seu Idelfonso, sempre muito gentil e educado, dizia que foi apenas um lapso.

Quem quiser comprovar a veracidade dessa história, é só dar uma folheada na ata número um da mais importante entidade espírita da região. Lá está o Centro Espírita “São” Lázaro.