Opinião: Chuvas no compasso de luz

Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho (de Passos)

Opinião: Chuvas no compasso de luz
Luiz Gonzaga Fenelon Negrinho é advogado.)




Peço licença para dizer. Entre estampidos e glórias, saúdo a chuva que cai. Ouço o ruído não como manifestação da resolução dos problemas emergentes e essenciais da vida. Falta muito ainda. Mas o som e o cheiro da mansidão. A flexibilização climática vem da terra, do ar que se respira, do verde que espalha o aroma inexplicável de tão agradável e gostoso.

É como se fosse a chegada da seiva da vida, o suco divino provindo do alto, em forma de musicalidade para os nossos sentidos. Um brinde saudável à primavera por chegar. É vazão ao colorido das necessidades vitais. Chuva abençoada, chuva de São Pedro, de Deus. Fonte viva da natureza mãe.

Que encha os poços de esperança e transforme os filetes d’água em caudalosos rios a correrem rindo de alegria e satisfação, na magnitude do desenho de um tempo amargo que ficou para trás.

Por isso estou feliz. E não diferente do que aprendi na escola, rendo graças e louvores num momento tão importante. É chuva providente. Penso célere na manchete do meu pobre Rio Formiga que está por um fio. Também na secura do Rio Grande, cujos peixes não têm como ir e vir, nem sequer respirar. E no reaparecimento de pedaços de cidades e arrabaldes inundados em nome do progresso, mandando tristes acenos para os pósteros que não sabem se oram, choram ou se rendem a palavras de conjugação de interesses por coisas que um dia se perdem nas brumas do vazio.

Regalo-me na bondade do Senhor e seus séquitos trazendo mensagens de acalanto e amor. Sensibilidade boba. Ao enobrecer a chuva de que tanto se precisa, de repente fina-se o barulho da água. Soberana chuva. Da redenção à dádiva, percebe-se que ela se foi. Parou de cair. O mundo não ruiu e nem há de ruir. Apenas uma demonstração de precipitação de água que veio para dizer “olá”. Distanciou-se sem dizer adeus. Há de voltar. Espera-se.

Chuva de molhar bobo o que aconteceu. Não molhou a terra direito. As mangueiras das hortas das casas não perderam a esperança. Encheram-se de fôlego e disse às demais plantas que a chuva dará o ar da graça, sem tormento, revolução, tufão. Serena a fazer inveja à quietude do velho ao tomar café no rabo do fogão a lenha.

A chuva, por menos densa seja, modifica o cenário de todos os espetáculos. O desejo é que volte o quanto antes como se convidada para uma festa de muitos cortejos e comemorações.

Venha, chuva. Venha! Caia de mansinho e faça o seu ninho no aconchego dos corações das pessoas. Há razão para sua vinda. São vidas em jogo. Não há de aborrecer pela insistência. Precisamos de sua presença como o homem precisa do ar e água, essência da vida.

Ora, pois. Que bobagem. Pelo vapor atmosférico, chuva água é. Dispensa-se o convite para figura tão importante. Que entre sem bater - licença concedida -, sem o aval de prévia comunicação.

Tome assento o quanto quiser, em grande estilo e receba o carinho em seu curso pluviométrico normal, dando pernas para o Rio Formiga andar de braços e abraços para o agradecimento do Rio Grande.

Em conjunto, ao deleite. Solenidade da vinda de uma “Chuva de Prata”, no acalento da “chuva que cai sem parar. E quase nos mata de tanto esperar. Um beijo molhado de luz sela o nosso amor”. Linda a canção, em forma de prece e oração. Se tiver luar no céu, melhor ainda. A chuva será prateada. E anjos e arcanjos entoarão cânticos nunca antes cantados e ouvidos na majestade de uma inefável beleza, como a letra composta por Ed Wilson.

Se vivo estivesse, teria completado mais um ano de vida no dia quatro de outubro. Antes de despedir-se deste mundo, deixou-se levar pelos afagos de Jesus, a quem agradeceu originalmente compondo e cantando músicas do gênero gospel.

Gospel é uma palavra em inglês (negros e brancos norte-americanos cantam maravilhosamente esse estilo musical) e significa “palavra de Deus”. A fusão de “God” mais “Spell”.

Se alguém quiser misturar “God” com “good”, sem problema. Deus há de permitir. Decerto virará “good news”, ou a “boa nova”, referência ao Evangelho da Bíblia. Deus é bom! Como é. Tremendo!

Quanto às chuvas que não caíram na suficiência, torcidas continuam de pé, como em “Súplica Cearense”. E se pede ao sol que se esconda um tiquinho pra ver se uma planta nasça no chão. Entretanto, assim como Dominguinhos, que elas venham não com manifestação exagerada, em confusão. Acerquem-se, pois. No compasso primaveril da espera e necessidade. Pianinho, pianinho. Viva! E vivamos à espera da fonte de uma água não misturada a nenhuma substância estranha, porquanto há de simbolizar a fé, a esperança e a paz de que tanto ansiamos neste mundo de tanta violência e amargura.

Nunca é demais pedir, repetidamente, chuva abençoada: cadê você?