Crônica: O pote

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: O pote
Manoel Gandra é poeta e jornalista




São incontáveis as histórias pitorescas envolvendo o nome do ex-vereador João Dias. Acredita-se que algumas tiveram outros protagonistas, mas sempre tem um que vem e diz: “foi com João Dias”.
Católico fervoroso, João Dias não deixava de ir à missa aos domingos, não perdia terços e velório que era velório só era velório se tivesse a sua presença.
Contam que, em um sábado, João Dias tinha um batizado na Lajinha (ia ganhar mais um compadre) e o almoço prometia ir até a noite. Seria uma festança, como diria o ex-vereador, “sacudida”.
Aconteceu que, pela manhã, morreu uma senhora muito estimada na Rua Nova e ele não poderia faltar ao enterro, que foi marcado para as cinco da tarde, no Cemitério do Rosário.
Para poder participar dos dois eventos, João Dias deu um jeito de arrumar uma bicicleta emprestada. Ele ficou no batizado até meia hora antes do enterro e depois foi para o velório. Só que o Sílvio Coveiro tinha deixado para furar a cova na última hora e o pessoal acabou tendo de esperar.
Depois de tudo pronto, João Dias resolveu dar uma esticada na bicicleta porque o pessoal do batizado estava esperando. Desceu o morro que nem um corisco. Assim que passou pelo Colégio Santa Teresinha, o freio não funcionou. Ele olhou pra baixo e o cabo tinha arrebentado. Tentou colocar o calcanhar na roda da frente, mas ela arrancou o salto da botina. Passou pela Igreja Matriz.
Quando chegou à Praça São Vicente Férrer, acabou atravessando a rua, entrando com bicicleta e tudo dentro do antigo Armazém Pieroni (que funcionava onde é hoje a residência do empresário Jair Albergaria) e foi quebrando o que havia pela frente.
Passou pelo balcão (derrubou um balaio de bananas com o guidom), ao lado de uma sacaria de arroz, entrou por um corredor e acabou quebrando um pote de água que ficava na porta da cozinha da Dona Marina e do Seu Chico Pieroni, casal de italianos que veio para Formiga no início do século para montar o armazém.   
Na hora, foi um corre-corre, todo mundo acudindo. João Dias se levantou, bateu o chapéu na calça e deu uma ajeitada na gola da camisa:
__Foi nada não gente, foi nada não. Estraguei alguma coisa?
Meio sem graça, Dona Marina explica que não houve maiores prejuízos e que ela só lamentava pelo pote, que tinha sido trazido da Itália e que estava na família há anos.
João Dias fechou a cara e fez aquela reclamação que ficou na história:
__E a culpa é minha? Porta de cozinha é lugar de colocar pote?!!!
Muito aborrecido, o ex-vereador saiu do armazém e voltou para o batizado.