Opinião: Atraso em voo

Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Opinião: Atraso em voo
Maria Lucia de Oliveira Andrade é advogada




Quando ela começa sua conversa, percebo que já leu sobre seus direitos como consumidora. É que vivenciou uma situação bastante comum para aqueles que contratam viagens aéreas.

Depois de muito tempo sem viajar, resolveu conhecer Orlando, apesar das ressalvas de seus filhos quanto a isso, devido ao fato de ela ter quase oitenta anos. Certa de que era idosa, mas não incapaz, ignorou essas ressalvas e providenciou tudo, de modo que as passagens aéreas, o hotel e os tíquetes dos passeios escolhidos por ela chegaram às suas mãos bem antes da data da partida.

Pagou a um motorista, que a levou até o aeroporto de Confins. Fez o check-in e ficou aguardando o aviso de chamada. Estranhando a demora, leu na tela de avisos que o voo estava atrasado. Experimentou o que se chama de “chá de aeroporto”. O estresse e o cansaço tomaram conta dela, principalmente ao ver aumentar o inchaço de seus pés e tornozelos.

Depois de esperar mais de três horas, ela e os outros passageiros foram informados de que o voo fora transferido para dois dias depois. Ela e eles correram ao guichê da companhia aérea. Nada adiantou ela dizer que residia em outra cidade e que perderia tíquetes de passeios já contratados. Em resposta, disseram-lhe que a aeronave estava passando por manutenção. Silenciaram diante da pergunta dela: “Por que não fizeram essa manutenção antes?”

Suplicou à atendente que a realocasse em um outro voo que partiria naquela noite. Isso lhe foi negado, com base na justificativa de que a aeronave já estava lotada. Então, pediu que a transferisse para o voo de outra companhia aérea que fazia o mesmo roteiro e que sairia duas horas depois, mas isso também lhe foi negado.

Muito contrariada, frustrada e exausta, vendo que não conseguiria nada, ligou para uma neta que morava em Belo Horizonte e pediu que a hospedasse por dois dias, pois ficaria muito caro voltar para sua cidade e contratar novamente um motorista para trazê-la ao aeroporto. O dissabor quase a fez desistir da viagem, mas, com o sim da neta, resolveu seguir adiante.

Foi bom não ter desistido, pois se divertiu muito em Orlando. Essa cidade, lugar da Disney, sempre fora para ela, em sua imaginação, um reino encantado. Vivenciou cada momento como uma criança que realiza seu sonho. Conseguira, ao chegar, comprar novos tíquetes dos passeios que o adiamento do voo a tinha feito perder.

Ela me diz que aeroporto – aquela companhia aérea, especificamente – passou a ser seu pesadelo, pois o retorno ao Brasil também foi um problema. Na tela de avisos, leu que o voo de retorno se atrasaria por mais de duas horas. Depois da saga da vinda, seu coração acelerou e ela caiu direto no desespero, pois seu voo tinha conexão. Se perdesse a conexão, teria de encontrar um voo subsequente. De qualquer modo, chegaria a Confins de madrugada, e o motorista, com quem já tinha combinado de esperá-la, ficaria horas lá. Foi até o guichê da companhia aérea, relatou sua situação, insistiu que seu problema fosse solucionado, chorou, até que foi realocada em outro voo.

Entrou em contato com o motorista, que, àquela altura, já tomava um “chá de estacionamento”, e muito mais tomaria, pois ela realmente viria a perder a conexão.

Ela me pergunta sobre seus direitos nessa situação.

Explico-lhe que a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) determina que, quando houver atraso de voo por mais de quatro horas em relação ao horário originalmente contratado, ou cancelamento do voo, a companhia aérea ofereça aos passageiros alternativas de reacomodação, reembolso e execução do serviço por outra modalidade de transporte, devendo a escolha ser do passageiro.

Isso tem de ser oferecido também quando há perda do voo subsequente pelo passageiro, nos voos com conexão. Se a companhia souber com antecedência que o voo atrasará mais de quatro horas em relação ao horário originalmente contratado, essas alternativas têm de ser oferecidas imediatamente aos passageiros.

Como, segundo o que ela me relatou, nada disso foi oferecido a ela, a companhia aérea violou o que é determinado pela ANAC; portanto, agiu de modo ilícito. É evidente que ocorreu uma falha na prestação do serviço, pois houve um atraso de mais de 48 horas para a chegada dela ao seu destino. Ela sofreu prejuízo material (gastou com transporte para chegar à casa da neta e para retornar ao aeroporto, com alimentação, com recompra de tíquetes, etc.).

Pergunto se tem os recibos dos gastos advindos do adiamento e do atraso dos voos. Ela me confirma que os tem. Ótimo. Isso é fundamental para comprovarmos o dano material.

Quanto ao prejuízo moral, este está configurado na exposição a uma situação de estresse e frustração que ultrapassa o simples dissabor. O fato de ser idosa agrava isso.

Se a companhia aérea alegar que o adiamento do voo se deu por necessidade de manutenção de aeronave, poderemos rebater esse argumento, pois os Tribunais não têm considerado isso como motivo de força maior. É obrigação básica das companhias aéreas manter suas aeronaves em perfeito estado para o voo.

O que o consumidor espera é que elas ajam com presteza e cuidado, proporcionando-lhe um mínimo de segurança nas informações e conforto. A ela não foi proporcionado isso. Essa negligência precisa ser punida, para que outros não vivenciem experiência semelhante à vivenciada por ela.