Ficou sem condições de pagar a pensão alimentícia

Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Ficou sem condições de pagar a pensão alimentícia
Maria Lucia de Oliveira Andrade é advogada




“Estou num mato sem cachorro”. É sua primeira expressão quando se senta diante de mim, em meu escritório. Não consigo impedir o riso, embora não o conheça nem tenha qualquer intimidade com ele. É que me vem à mente que já não vivemos em tempos de caça, com muito mato próximo a nós, perigoso o suficiente para não o adentrarmos sem a companhia de um cachorro. Pelo visto, o pobre homem está se sentindo acuado.

Conta-me que tem três filhos: duas adolescentes do primeiro casamento, e um menino, fruto da segunda união. Quando se divorciou, foi acertada em Juízo uma pensão alimentícia de um salário mínimo e meio, pois, à época, tinha uma renda mensal de cerca de R$3.500,00. Trabalhando por conta própria, oferecia seus serviços como motorista particular, e, sendo as viagens praticamente diárias, conseguia atingir esse valor, com poucas variações para mais ou para menos.

Passou o tempo, e ele se casou novamente. Agora, tem mais um filho para criar.

A crise econômica bateu à sua porta quando passou a ser chamado cada vez menos para viagens. Foi aí que passou a entender que aquilo que ouvia nos noticiários sobre barris de petróleo tinha muito a ver com sua vida diária. A alta do combustível o obrigara a subir o preço da viagem, e isso afastou muitos clientes, que passaram a usar os próprios carros.

Foi ficando crítico viver sem a segurança de uma remuneração fixa, vinda de um trabalho com carteira assinada. Então, quando surgiu a oportunidade de se empregar como auxiliar de almoxarifado em uma fábrica, montou nesse cavalo que passou arriado. O problema é que a remuneração é de apenas um salário e meio, o mesmo valor que paga como pensão alimentícia. Quer saber o que pode fazer para demonstrar legalmente que não consegue mais cumprir essa obrigação.

Pergunto a ele se está registrado em sua carteira de trabalho o valor de um salário mínimo e meio, e se é mesmo apenas essa sua renda mensal. Ele diz que sim. Pergunto o que ele se propõe a pagar como pensão alimentícia. Responde que o máximo que consegue assumir é o percentual de 50% do salário mínimo.

Explico a ele que, de acordo com a lei, é possível rever o valor estabelecido para a pensão alimentícia, quando se altera a situação financeira de quem cumpre com essa obrigação ou de quem a recebe. A lei dispõe que os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do alimentando, mas também dos recursos da pessoa obrigada, isto é, o valor estabelecido deve levar em conta o binômio necessidade X possibilidade (necessidade de quem requer a pensão X possibilidade de quem tem a obrigação de pagá-la), assim como a proporcionalidade.

A mudança da sua condição se deu por fato alheio à sua vontade. Observada a piora da sua capacidade financeira, ainda que as necessidades das duas filhas sejam também comprovadas, defenderemos em Juízo que ele não consegue mais cumprir o que antes foi determinado. O valor de um salário mínimo consome praticamente quase todo o seu salário.

Para isso, ajuizaremos uma ação revisional de alimentos, em busca de um valor adequado à sua capacidade financeira atual. Para fundamentar o pedido, juntaremos à petição uma cópia da sua carteira de trabalho e dos demonstrativos de pagamento de salário, comprovando sua função e remuneração.

Assim ficamos combinados.

Ele compreendeu o que está estabelecido em lei: fixados os alimentos, se ocorrer mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo.

 

Maria Lucia de Oliveira Andrade

maluoliveiraadv201322@gmail.com