Opinião: Desenhando a Lei Rouanet

AC de Paula (de São Paulo/SP)

Opinião: Desenhando a Lei Rouanet
AC de Paula é dramaturgo, poeta e compositor




Papo de lei é muito chato eu sei por isso quase ninguém tem saco para ler, e muitos, pós-graduados nas instituições das redes e parafernálias virtuais, saem por ai, dissertando teses sobre o assunto sem de fato saber sobre o que estão falando. Coisa comum nesses tempos modernos.
A Constituição Federal em seus artigos 215/216 e parágrafos, disciplina o incentivo à cultura e garante a todo cidadão o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e deve apoiar e incentivar a valorização e difusão de manifestações culturais.
O patrimônio cultural brasileiro engloba os bens de natureza material e imaterial, as formas de expressão, os modos de criar, fazer e viver, as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais, os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
Deve o Poder Público, com a colaboração da comunidade, promover e proteger o patrimônio cultural brasileiro, estabelecer incentivos para a produção e o conhecimento de bens e valores culturais. É facultado aos Estados e ao Distrito Federal vincular a fundo estadual de fomento à cultura até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, para o financiamento de programas e projetos culturais.
Transcrevendo para uma linguagem popular, a cultura e o seu incentivo, são obrigação do Estado que deve facilitar o acesso a fontes de cultura; promover e estimular a regionalização; apoiar, valorizar e difundir manifestações culturais; e preservar bens materiais e imateriais, e são tão importantes que estão protegidos e disciplinados na nossa lei maior.
Há dois anos 968 milhões de reais destinados à lei de incentivo a cultura estavam bloqueados com 1946 projetos culturais paralisados, pois para o governo anterior a preservação e a produção de cultura nunca foi sequer necessária, tanto que ele extinguiu o ministério da cultura. Leia-se, portanto, que o governo deixou de cumprir uma obrigação respaldada constitucionalmente. Arredondando o valor para um bilhão, como se vê nas manchetes, os protestos da turma do eu sou contra começaram a pipocar, para quem não sabe a arrecadação do governo federal encerrou 2022 com recorde de R$ 2.218.484 trilhões.
Quando conhecemos esses dados concluímos que um bilhão não é um valor espantoso, todos reclamam dos impostos, mas continuam reclamando quando recursos oriundos desta arrecadação são destinados à cultura. As empresas podem abater do imposto de renda a pagar até 4% de valores destinados a cultura, ou seja o empresário desconta o valor destinado ao incentivo cultural.
O processo de liberação de captação de verba através das leis de incentivo é burocrático e transparente. Quando você sabe que Claudia Raia foi autorizada a captar cinco milhões de reais, deve se atentar também, para o fato de que este dinheiro não foi colocado à sua disposição. Ela ainda vai ter que ralar e correr atrás dos patrocinadores, ou seja, captar patrocínio. Nem sempre se consegue captar o valor total e em geral, metade das propostas aprovadas pelo Ministério da Cultura não consegue arrecadar dinheiro algum.
Qualquer produção teatral, por exemplo, gera emprego para muita gente, e consequentemente gera também custos, todo o valor que for captado constará de uma planilha onde os custos estejam detalhados minuciosamente não podendo haver direcionamento diverso para a aplicação da verba.
Os valores a serem liberados pelas leis de incentivo levam em conta a contrapartida sociocultural que o produtor do espetáculo se compromete a realizar. Para o empresário a regra é clara, ou ele paga normalmente os 4% que podem ser destinados ao incentivo cultural e não tira nenhum proveito de estar cumprindo a sua obrigação, ou utiliza o percentual respectivo em um projeto cultural que de alguma forma vai divulgar a sua marca.
Reclamam também que artistas e produtores renomados sempre conseguem autorização para captar valores mais altos. Agora você meu caro leitor, na hipótese de ser um empresário favorável a utilização de parte do seu imposto nas condições já explicadas acima, iria apoiar, por exemplo, A DAMA DE AZUL uma peça teatral escrita por este que vos escreve, ou qualquer outro projeto de um artista de renome, que é obvio agregaria mais prestígio para a sua marca?