Opinião: O filho morreu, e ela dependia dele...
Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)
É uma senhora maltratada pelo tempo. As costas já se dobram ao peso dos anos e do trabalho. É fácil reconhecer a ação da vida difícil e do trabalho braçal, quando suas mãos calejadas tocam as minhas, em um cumprimento. Parece-me abatida, o que se explica em seguida, quando me conta que seu filho faleceu dois meses antes. Foi na lida da roça que ele morreu.
Conta-me que ele era o filho que lhe restara dos cinco que tivera. Diz, com olhos marejados, que os pais deveriam morrer após os filhos, e não o contrário. Sua dor me toca. Não é fácil passar por tantas perdas – o marido e os filhos –, ficando praticamente só no mundo. Ninguém imagina isso quando constitui a própria família.
Ela me relata que morava na zona rural com o filho. Viviam na terrinha que sempre fora deles, onde cultivavam hortaliças que vendiam na feira da cidade. Com o dinheiro desse trabalho, conseguiam manter as condições necessárias para a produção das hortaliças e suprir algumas das necessidades deles. O que faltava era complementado com a aposentadoria dela. Agora, sem a contribuição financeira advinda do trabalho do filho, está em apuros, pois as despesas que tem com medicamentos é alta.
Com a ajuda de uma vizinha mais esclarecida, fez um requerimento ao INSS pedindo pensão por morte do filho. Infelizmente, obteve resposta negativa a esse pedido.
Pergunto se o filho deixou esposa ou companheira, ou filhos. Ela me diz que não.
Então, explico que, para o INSS, têm, prioritariamente, direito a pensão por morte, o cônjuge/companheiro(a), os filhos com menos de 21 anos, assim como os filhos maiores de idade que têm incapacidade para o trabalho. Porém, não havendo nenhum desses prioritários, há previsão na lei, sim, de que os pais possam receber essa pensão por morte, se comprovarem que eram dependentes economicamente do falecido.
Essa comprovação pode ser feita por meio de documentos, como certidão de nascimento de filho, certidão de óbito, comprovante de que era segurado do INSS, declaração do imposto de renda em que ela conste como sua dependente, prova de que tinham o mesmo domicílio, conta bancária conjunta, registro em associação de qualquer natureza em que ela conste como dependente dele, ficha de tratamento em instituição de assistência médica em que ele constou como responsável por ela, entre outros.
Ela me conta que conseguiu apresentar as certidões de nascimento e de óbito, o comprovante de que ele contribuía com o INSS, um comprovante de que residiam no mesmo imóvel, bem como uma cópia do formulário de internação dela para tratar uma pneumonia, no qual ele constava como pessoa responsável por ela. Apresentou também o depoimento de testemunhas que relataram que ele arcava com grande parte do sustento dela. Mesmo assim, o INSS negou o requerimento, alegando que ela não apresentou provas suficientes.
Pergunta se o fato de ela já receber aposentadoria de um salário mínimo é que teria influenciando na decisão do INSS. Respondo-lhe que não deve ter sido isso, pois não é fator que a impede de lhe ser concedido o benefício de pensão decorrente do falecimento de seu filho. O que importa é se ficou comprovado que ele contribuía significativamente com o pagamento de despesas domésticas, e que ela, por depender dele, ficou em situação muito difícil.
Digo-lhe que, a meu ver, ela deveria recorrer ao Judiciário para tentar mudar a decisão do INSS, pois ela apresentou duas das comprovações exigidas em lei. A lista de documentos de comprovação da dependência financeira admite que outros tipos de prova sejam apresentados, como foi o caso do depoimento de testemunhas.
O INSS teria de ter avaliado todas as provas produzidas para demonstrar essa dependência, e não apenas aquelas que constam na lista de requisitos previstos em lei. Nada impede que a relação de dependência econômica seja comprovada por prova testemunhal, principalmente quando se trata de famílias de baixa renda. Assim já decidiu o Superior Tribunal de Justiça
Na ação, o argumento será que as provas apresentadas foram suficientes para demonstrar a dependência dela em relação ao filho falecido. Ressaltaremos que ela está enfrentando dificuldades financeiras após a morte dele. Também pediremos o pagamento dos valores devidos, referentes à pensão por morte, desde a data do requerimento que ela apresentou ao INSS.
Ela concorda com minha sugestão de ajuizar uma ação de concessão de pensão por morte. Vamos em frente.