Crônica: O cabo eleitoral

Manoel Gandra (de Formiga/MG)

Crônica: O cabo eleitoral
Manoel Gandra é poeta e jornalista




São incontáveis as histórias que têm como protagonista o dentista Lamartine Ramos. Aí vai mais uma.

Pessoa quase sem defeito, ele veio de Varginha para Formiga para montar uma clínica popular de odontologia.

Assim que chegou, se instalou na cidade e ganhou fama. As filas de seu consultório dobravam esquina e alguns dos tradicionais dentistas da cidade começaram a se preocupar em perder clientela. O prefeito na época era Ninico Resende e logo foi procurado por um profissional da área (que sempre tem idéias de índio) para que fosse montada uma estratégia para acabar com aquela clínica (dizem que Lalá só não foi embora porque tem um irmão que tinha um importante cargo na Arrecadação Fazendária estadual e o pessoal ficou com medo).

Como o seu primeiro contato com os poderosos da cidade não foi dos mais simpáticos, Lamartine resolveu se distanciar de problemas, não se envolvendo em pendengas com sua classe ou com políticos. Dava de ombros.

Muito agradável, o dentista fez grande amizade com muita gente. O radialista Landico (outro gozador de primeira linha) foi dos primeiros.

O tempo foi passando, até que Landico resolveu se candidatar a vereador e tinha a idéia de que o companheiro Lalá seria um ótimo cabo eleitoral, era preciso convencê-lo a ajudar. Afinal de contas, seu amigo estava sempre com o consultório lotado e a cidade o adorava.

__Ô Lalá, eu tava pensando... eu vou ser candidato a vereador, você me ajuda?

__Quem dera...!

__Olha, eu mandei fazer uns adesivos e queria que você pregasse no seu carro. Como você é muito conhecido...

__Quem dera...!

__...quem gosta de você, vê que você vai votar em mim e vota também.

E ficou combinado. Assim que os adesivos ficaram prontos, Landico levou mais de 20 para Lamartine. Só que o tempo foi passando e nada de o radialista ver os adesivos no carro de Lalá. Landico já estava meio sem graça quando, em uma manhã de domingo, encontra-se com o amigo na porta do Bar Asa Branca e resolve reclamar da falta de interesse por sua campanha:

__Pô, Lalá, eu lhe dei os adesivos e você nem pregou no seu carro.

__Preguei sim.

__Pregou não. Eu vi seu carro sem os adesivos.

__Preguei sim.

__Então vamos lá pra ver.

E os dois foram até o carro do dentista que estava estacionado no princípio da Rua Silviano Brandão. Uma turma que estava jogando damas acompanhou. Lamartine abre o porta-malas e todos os adesivos de Landico estavam grudados no pneu sobressalente .

__Mas aí, Lalá...?

__Uai, cê num falou onde que era pra colocar...

O pessoal fez a festa. Dias depois, Landico acabou abandonando a campanha.