Opinião: A patroa está impondo mudança no horário de trabalho

Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Opinião: A patroa está impondo mudança no horário de trabalho
Maria Lucia de Oliveira Andrade é advogada




Ela trabalha em uma lanchonete há cinco anos, no período de 06h40min às 15h.   Quando iniciou esse trabalho, sua filha tinha dois anos de idade. Organizou-se, com a ajuda de sua mãe, de modo que conseguisse combinar a rotina da filha com a sua. Sendo mãe solteira, só conta com a ajuda da mãe.

Tudo transcorria bem até que começou a perceber que a dona da lanchonete parecia insatisfeita com ela. Procurou dedicar-se ao trabalho para evitar algum atrito. A aparente insatisfação se transformou em reclamações verbais, muitas vezes feitas diante dos colegas de trabalho e de clientes da lanchonete. A patroa aumentou as exigências em relação a ela. A diferença entre o tratamento exigente dado a ela e o dado aos colegas ficou gritante. Como precisava muito daquele trabalho, procurou suportar aquilo em silêncio.

Porém, agora, algo incontornável está sendo exigido dela. A patroa determinou que seu horário de trabalho mudará para o período de 09h50min às 18h10min.

Conversou com a patroa, alegando que não teria como trabalhar nesse horário, pois a rotina da filha, que agora tem sete anos, seria completamente alterada. Além disso, infelizmente, a mãe dela não poderia ficar com a menina. Detalhou o impacto da mudança de horário, alegou que outros colegas tinham sido mantidos no período costumeiro de trabalho, mas a patroa se manteve irredutível. Ficou claro que esta não mais a quer trabalhando ali, mas não assume a responsabilidade por demiti-la.

Foi essa situação angustiante que a trouxe a mim. Quer saber o que pode fazer para proteger seu direito de trabalhadora.

Pergunto o que a empregadora dela alegou para a mudança de horário. Ela me diz que a única justificativa foi que seria melhor para a lanchonete. “Melhor, como?” – pergunto. Ela não sabe explicar, porque a patroa não disse nada além disso. Pergunto se não há mesmo como combinar o novo horário com suas necessidades e as da filha. Ela me diz que, se for mudado o horário da forma determinada pela patroa, ela terá de pedir demissão, pois não haverá como cumprir compromissos já assumidos e os cuidados com a filha.

Explico a ela que o empregador tem o direito de alterar o horário de trabalho do empregado, desde que justifique essa necessidade. Esse direito não é ilimitado. Só é legal essa alteração se ambos consentirem com essa mudança e se não houver prejuízo direto ou indireto ao empregado.  Se a alteração for prejudicial a esse empregado, não será lícita. Pelo que ela me relata, é o caso dela.

Com base no horário de trabalho estabelecido em contrato e que foi praticado durante cinco anos foi que ela organizou seus compromissos e sua rotina de cuidados com a filha. A mudança está ocorrendo sem mútuo consentimento e está causando prejuízos a ela e à filha. Está havendo uma alteração unilateral do horário de trabalho, sem que a empregadora dela apresente um motivo legítimo para isso. Isso é considerado prejuízo ao empregado.

Essa conduta é abusiva e, diante desse quadro, ela, como empregada, pode requerer a rescisão indireta do contrato de trabalho. Ela me olha interrogativamente. Explico-lhe que isso significa que, como a mudança lhe é prejudicial e não é feita em mútuo consentimento, tornando inviável a relação empregatícia, ela pode, nesse caso, rescindir seu contrato de trabalho. Se provar o ato ilícito da empregadora, seja por meio de provas documentais ou testemunhais, receberá todas as verbas rescisórias, inclusive os 40% do FGTS, como se tivesse sido demitida sem justa causa.

Ela argumenta que um processo desse leva tempo e que, enquanto isso, ficará obrigada a cumprir o horário determinado pela patroa, prejudicando a filha. Explico-lhe que poderá pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas verbas, permanecendo ou não no serviço até a decisão final do processo.

Outra possibilidade é redigir uma notificação extrajudicial endereçada à patroa para que esta não modifique o horário de trabalho até o final da ação trabalhista. Se não acatar essa notificação, poderemos requerer ao Juízo uma tutela provisória de urgência antecipada, de modo que a patroa seja impedida de fazer a alteração do horário de trabalho, mantendo a mesma jornada, até que a ação seja julgada, sob pena de multa se não cumprir essa medida.

Acrescento que, se tiver como provar que sofreu assédio moral no trabalho, com ofensas verbais, críticas em público e tratamento rigoroso excessivo, comparado ao dado aos demais colegas, existe a possibilidade de requerer também o pagamento de uma indenização por danos morais.

Ela sai com a incumbência de me apresentar os documentos que lhe pedi e de averiguar se conseguirá testemunhos de colegas e clientes que possam confirmar o que ela alega. A responsabilidade por provar isso é toda dela. Amparada legalmente ela está; cabe-nos provar o seu direito.

 

 

Maria Lucia de Oliveira Andrade

maluoliveiraadv201322@gmail.com