Opinião: Ela quer que o ex-marido seja multado por descumprir as visitas ao filho

Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Opinião: Ela quer que o ex-marido seja multado por descumprir as visitas ao filho
Maria Lucia de Oliveira Andrade é advogada




A dissolução do matrimônio ou da união estável gera sofrimento não apenas para o casal. Se não é saudável que os filhos cresçam em um ambiente transformado em arena pelos pais, com agressões verbais e, às vezes, até físicas, também não o é quando um ignora o outro, mantendo apenas as aparências de vida em comum. Famílias com filhos são formadas para serem lugares de promoção e desenvolvimento do ser humano, e não para serem fomentadoras de desajustes e traumas.

Por outro lado, se alguém afirmar que a separação resolve tudo, estará cometendo um equívoco. Ela gera sofrimento para todos os envolvidos. Para os filhos que são crianças ou adolescentes, mais ainda. Mesmo assim, muitos adultos decidem por ela sem considerar isso.

Considerar os desdobramentos não significa abrir mão da própria vida e tolerar tudo em nome de uma união que já não tem nenhum sentido e que causa aos filhos mais mal do que bem. Decidir separar-se exige muita calma e ponderação. Brincando com a recomendação popular “Muita calma nessa hora. ”, há de se ter “muita hora nessa calma”.

É sobre isso que nós duas conversamos. Ela me procurou porque se cansou de tentar convencer o ex-marido a respeito da importância de ele conviver com o filho. O menino tem dez anos e sente demais a falta do pai. No processo de divórcio, ficou estabelecido que a guarda seria dela e que as visitas dele ao menino seriam em finais de semanas alternados.

Contudo, as visitas só foram regulares nos quatro primeiros meses após o divórcio. Depois disso, tornaram-se esporádicas. Já faz dois anos que ocorrem assim, ficando mais e mais espaçadas. Ela percebe que o filho sofre com isso e acredita que a piora do rendimento escolar dele esteja sendo motivada por esse distanciamento do pai. Já falou com o ex-marido a respeito disso várias vezes. Ele ouve, concorda com os argumentos dela, mas continua não cumprindo o combinado. Sempre encontra uma desculpa para não buscar o filho.

Ela acha que o ex-marido não cumpre o combinado, porque está namorando. Na sua opinião, ele vê o filho como um estorvo para seus programas de final de semana. Com esse namoro, ela teme que o distanciamento se acentue. Pergunta se pode ajuizar uma ação contra ele por descumprir o acordo e requerer que seja multado devido a isso.

Em resposta, comento com ela que o regime de visitas é estabelecido para assegurar o direito de visitação a quem não é o guardião da criança. O guardião assume a obrigação de permitir que essa visitação ocorra de acordo com o que foi acordado. Chamo a atenção: a obrigação é imposta ao guardião, que não pode impedir que as visitas ocorram.

Recentemente, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul pronunciou-se a respeito de um caso semelhante, decidindo que, se as visitas não ocorrem porque aquele que não tem a guarda resolve não fazê-las, não há como obrigá-lo juridicamente a isso. O relator da ação alegou que não há lei que obrigue o pai da criança a visitá-la e a lhe dar carinho. Ressaltou que, se a convivência entre os dois fosse forçada, isso poderia causar diversos prejuízos ao filho, inclusive traumas maiores. Forçar isso provavelmente despertaria a resistência e a rejeição do pai em relação à criança.

Ela argumenta que ouviu falar que a Lei de Alienação Parental prevê multa. Confirmo que há previsão de multa nessa lei, mas se trata de uma situação diferente: aquela em que o pai ou a mãe atua como alienador da criança, impedindo ou dificultando a convivência desta com o outro genitor (por exemplo, desqualifica a conduta do(a) genitor(a); omite propositadamente a ele(a) informações pessoais relevantes sobre a criança ou adolescente; muda o domicílio para local distante, sem justificativa, etc.). 

O caso que ela me apresentou é diferente disso. A Justiça protege a criança quanto ao seu direito de ter a visita do pai. Para isso, regulamenta a guarda para que o guardião não impeça o convívio entre a criança e quem não tem a guarda. Porém, não pode obrigar o afeto e o convívio, que são, essencialmente, de natureza espontânea.

Observo que fica desconsolada. Digo-lhe que, se seu objetivo é estreitar o convívio entre o ex-marido e o filho, talvez possa, mais uma vez, conversar com ele para que definam dias da semana que favoreçam a visitação. Se finais de semana alternados não estão funcionando, talvez possam optar por dias entre segunda e sexta-feira. Assim, mesmo que isso não seja o melhor para ela, criará oportunidade para a convivência paterno-filial. É melhor tentar algo assim.

Sugiro que, feita essa tentativa, se ela não tiver êxito, preste toda assistência ao filho para que ele possa lidar com esse distanciamento do pai. Além disso, caso este se afaste por completo do filho, configurando-se o abandono afetivo, com consequências negativas na vida do menino, ela poderá ajuizar uma ação de indenização por abandono afetivo. Nesse caso, ela precisará reunir provas desse abandono e das suas consequências para o filho.

Ela se vai. Ouviu o que já sabia: não há como obrigar alguém a amar. Porém, talvez seja possível ajudar alguém a aprender a amar.