Opinião: Processada pelo neto, que requer pensão alimentícia

Maria Lucia de Oliveira Andrade (de Formiga/MG)

Opinião: Processada pelo neto, que requer pensão alimentícia
Maria Lucia de Oliveira Andrade é advogada




Ela aparenta ter cerca de oitenta anos. Anda com certa dificuldade, por isso opto por recebê-la em uma sala próxima à entrada. Está acompanhada por uma senhora, um pouco menos idosa. Logo fico sabendo que se trata de uma vizinha. Ofereço um cafezinho para as duas, mas não aceitam; preferem um copo d’água. Pergunto se quer conversar particularmente, e ela diz que não é preciso – a vizinha sabe o motivo que a trouxe a mim.

Conta-me que tem somente um filho e que este, por sua vez, é pai de um menino de dez anos. Esse filho se separou da esposa e se mudou para os Estados Unidos a convite de uma antiga namorada, com quem passou a viver. Desde então, tem tido poucas notícias dele.

Diz precisar da minha orientação, pois foi intimada a se manifestar em uma ação que o neto, representado pela mãe, sua ex-nora, ajuizou contra ela.  Pelo que soube, ela decidiu entrar na Justiça porque tentou, por diversas vezes, sem êxito, contatar o pai do menino para que ele pagasse a pensão alimentícia. Trata-se de uma ação judicial de alimentos, requerendo que ela, avó, assuma o pagamento dessa pensão.

O filho, com sua irresponsabilidade, colocou-a em uma situação difícil. Não concorda com a atitude dele – os pais têm a obrigação de cuidar dos filhos, de contribuir com o sustento deles. Mesmo sabendo que a ex-mulher luta com dificuldade, não envia nenhum tipo de ajuda para ela manter o filho. Não é obrigação da nora arcar sozinha com as despesas do filho. É difícil acreditar que não sobrem alguns dólares para enviar ao menino, já que não tem gastos com moradia. Pelo que sabe, ele, nos Estados Unidos, trabalha na área de construção civil, como ajudante de pedreiro.

Por outro lado, está magoada com a ex-nora, que sabe muito bem que ela é aposentada e vive com recursos minguados. Seu benefício previdenciário é cerca de um salário mínimo e meio, portanto não tem condições de assumir a pensão alimentícia que cabe ao pai do menino. Assumir essa responsabilidade significa colocar em risco a própria subsistência, considerando os gastos que tem com aluguel, alimentação, consultas médicas, medicamentos, entre outros.

Comento que, de fato, a lei estabelece que a prestação de alimentos é extensiva a todos os ascendentes, recaindo naqueles mais próximos em grau, uns em falta de outros. Se aquele que, em primeiro lugar, deve alimentos não tem condições de arcar com isso, o parente de grau imediato pode ser chamado a prestar esses alimentos. No caso, ela, avó, é a ascendente de grau mais próximo, por isso está sendo acionada judicialmente a cumprir a obrigação que cabia ao filho dela.

A lei não diz que ela, como avó, tem o dever de sustento, como é o dos pais, mas, sim, que tem o dever de solidariedade, devido à relação de parentesco. Trata-se de uma obrigação de natureza complementar e subsidiária. Se os pais não têm, comprovadamente, condições de sustentar os filhos, ou se só conseguem fazer isso parcialmente, os avós podem ser chamados a fazer isso, na proporção dos recursos que têm.

“Mas eu não tenho nenhuma condição de assumir essa obrigação!” – ela me interrompe, preocupada. Explico-lhe que, em sua defesa, poderemos demonstrar que ela não tem meios de arcar com a pensão. Para isso, precisaremos de comprovantes de seus rendimentos e despesas.

Chamaremos também a atenção para o fato de que não existem provas de que o pai do menino não tem recursos para prestar os alimentos. O fato de ele não responder ao contato da ex-nora não é prova de insuficiência de recursos dele. Alegaremos que é preciso ficar comprovada essa impossibilidade para que, então, ela seja acionada.

Alegaremos, ainda, que não foram esgotadas todas as possibilidades de obrigar o pai do menino a cumprir a obrigação. Sem esgotar essas possibilidades, a nora não tem direito de pedir alimentos diretamente a ela, avó.

Algo que pode ser feito, por exemplo, é requerer a produção de uma carta rogatória. Ela me olha interrogativamente, sem saber o que isso significa. Explico, de forma simplificada, que, no caso apresentado por ela, será uma carta enviada pelo Juízo do Brasil ao Juízo dos Estados Unidos, pedindo colaboração para intimar o filho dela a cumprir a obrigação alimentícia. Para isso, evidentemente, ela precisará fornecer o endereço dele naquele país.

Digo-lhe que será difícil ele provar que não pode arcar com a pensão alimentícia, pois, pelo que ela me contou, foi estipulada em 20% do salário que ele tinha. À época, ele estava empregado e recebia mensalmente dois salários mínimos.

Mesmo eu lhe mostrando que há maneiras de defendê-la, percebo que permanece inquieta e triste. No momento de vida em que está, passar por esse tipo de problema a deixa inconformada. Nunca pensou ter de se defender diante da Justiça. Porém, o que mais a entristece e preocupa é saber que seu neto está precisando do pai, e este não faz nenhum movimento no sentido de apoiar a criança.

De fato, nem todos entendem as responsabilidades que advêm da paternidade/maternidade. Isso é mesmo triste.

 

Maria Lucia de Oliveira Andrade

maluoliveiraadv201322@gmail.com